Superman (2025) deseja um mundo mais simples
Filme de James Gunn abraça os excessos da ficção científica para propor abordagem mais lúdica ao cinema de super–heróis
Por Gabriel Barcelos
Talvez devido ao número avassalador de produções do gênero, tanto para a TV quanto para o cinema, e também pela abordagem hiper militarizada da Marvel, em paralelo à lavagem cerebral que Zack Snyder e Nolan fizeram, convencionou-se acreditar que filmes de herói são feitos para adultos.
O movimento do cinema espelha o da indústria dos quadrinhos nos anos 80, com trabalhos mais sisudos como “Watchmen”, “A Queda de Murdock” e outras coisas. Alan Moore, autor de Watchmen e ferrenho crítico de sua indústria, comentou em entrevista ao The Guardian sobre como a infantilização de homens (destaque ao gênero) adultos “Fazendo filas para ver um filme do Batman” o preocupava e mostrava sinais claros de tendências fascistas, dentre elas, um desejo por um mundo mais simples. E por mais que narrativas do gênero de super-heróis tenham sido carregadas nas duas últimas décadas por um filtro acinzentado, uma fotografia achatada e sem textura, além de discursos políticos de meia de tigela, como a suposta apolítica do novo Capitão América, esses filmes não encontraram seu lugar como uma mídia “adulta”. O erro da Marvel talvez tenha sido investir na manutenção de sua base de fãs envelhecida ao invés de cultivar o imaginário dos mais novos; querem vender action figures, não mais brinquedos.
Não me admira portanto que seja um gênero já cansado e não tão bem visto comercialmente quanto era em 2019, quando era cool gritar no cinema ao ver um homem adulto erguendo um martelo contra um alienígena roxo. Fato é que uma quantidade inacreditável de adultos barbados assumiu uma irritante posição de autoridade num mundo em que qualquer tipo de discurso morria na planta dos projetos, assim como qualquer tipo de identidade visual mais interessante.
Falo tudo isso para pontuar que o cenário em James Gunn lança seu novo “Superman” (2025) é marcado por uma exaustão moral aos inúmeros tons de cinza que, novamente, não chegam a ser tão acinzentados quando se vendem.
O novo filme do herói é assumidamente mais radiante e vibrante do que a maioria das últimas empreitadas da indústria e resgata, diretamente do passado e dos quadrinhos, os elementos mais extravagantes da ficção científica para propor um mundo cartunesco e colocar o esvaziamento do gênero em crise.
O protagonista, interpretado por David Corenswet, diz em dado momento da história, ao explicar para Lois Lane como ser bom e acreditar no próximo soa não apenas antiquado, mas de alguma forma reacionário: “Isso não é ser Punk Rock hoje em dia?”.
Gunn não tem medo de abraçar o ridículo ao encher seu filme com todo o tipo de esquisitices e excentricidades com naturalidade. Temos alienígenas, robôs, super cães, magia, monstros gigantes, portais interdimensionais e um cientista maluco que gerencia tudo isso. Ele não faz a concessão de explicar a origem de seu mundo ao confiar que ainda resta para o seu público um pouco de imaginação.
Seu objetivo me parece então, de alguma forma, reeducar o fã de super-heróis a consumir esses filmes sem tanto julgamento.
E se a construção de mundo propõe uma experiência de ficção científica, visualmente ele escolhe filmar tudo com uma grande angular para equilibrar o máximo de elementos em tela ao mesmo tempo, distorcendo os heróis para que alcancem o máximo de sua potência gráfica, o filme convida a um novo tipo de espetáculo digital, um menos criterioso com o realismo dos efeitos e mais comprometido com as possibilidades de imagem que cada um dos personagens gera.
Toda essa plasticidade quadrinesca aparece na ação de Superman, mas encontra contrapontos temáticos muito interessantes nas encarnações de Lex Luthor (Nicholas Hoult) e Lois Lane (Rachel Brosnahan). A figura de Luthor, a versão mais maligna e lunática do personagem, integra a simplicidade que Gunn quer imprimir em seu projeto, funcionando como um cientista maluco de desenho animado e justificando todas as mirabolantes invenções científicas. A performance de Hoult traciona um viés mais caricato dos vilões desenhos animados, fortalecendo um tom quase episódico para a trama e servindo de paralelo às motivações nobres do herói.
Já Lane, muito mais ativa que as versões anteriores, também funciona como um contraponto à benevolência cega de seu parceiro romântico, ao oferecer algum tipo de conflito, mas também fortalecendo o eixo clássico do amor romântico. Mesmo o Superman de Corenswet parece uma figura muito mais cômica e afetada em sua performance do que qualquer encarnação anterior do herói para o cinema.
Juntos, os três criam um filme cheio de situações apegadas aos seus temas, de forma que tudo se resolve com uma conversa, depois da ação megalomaníaca do terceiro ato já estar resolvida. Abraçando uma inocência que dialoga com o cinema clássico em sua narrativa e o plástico e imaginativo em suas imagens, Gunn propõe uma abordagem mais fantasiosa e mostra uma visão menos descrente em relação aos mitos dos super-heróis.
Nota: 4/5
Editoria: Davi Reis
Revisão: Gabriel Barcelos
Hum... Estou lendo boas críticas... Mas não sei... #medo