Sensa! ainda é Sensacional?
Em sua comemoração de 15 anos, diante do crescimento, concorrências e mudanças, o Sensacional ainda sustenta o título de melhor festival alternativo de BH?
Por Daniel Santos
Criado em 2010 com uma edição tímida para cerca de mil pessoas, embaixo do Viaduto Santa Tereza, o Festival Sensacional cresceu junto ao renascimento dos bloco de ruas, ocupou a Savassi nos pré-carnavais e se reinventou para multidões de quase 20 mil pessoas na Esplanada do Mineirão, até chegar, em 2022, à sua nova casa no Parque Ecológico da Pampulha.
Com a proposta de ser sinônimo de ocupação e transformação urbana, como destacado em 2013 por Victor Diniz, produtor da Híbrido.cc, empresa idealizadora do evento, o festival se firmou como um espaço de celebração da diversidade, autenticidade e divulgação de artistas independentes, sem também desviar o olhar de nomes consolidados e destaques da música brasileira.
Em 2025, na última sexta (27) e sábado (28) de junho, ao completar 15 anos, a comemoração chegou junto a sua maior edição até agora, com um público total estimado de 25 mil pessoas, divididas entre a Noite de Abertura e o dia oficial, segundo dados da Prefeitura de Belo Horizonte. Assim, com uma história empolgante de mais de uma década e sendo exaltado nos bares, rodas de conversa e nas redes dos minérios, vale perguntar: o festival ainda sustenta o legado que construiu?
Ainda honra o nome?
Seu dia oficial se deu sob um sol gentil de 28 °C e terminou com a chegada de um frio leve de 14 °C, nada que um casaquinho não resolvesse. Uma vantagem proporcionada pelo local escolhido nos últimos quatro anos, desde que o Sensacional tomou sua decisão mais acertada: a ocupação do Parque Ecológico da Pampulha. O espaço é amplo, arborizado e harmônico, ainda que a poeira excessiva seja um incômodo. Mesmo assim, e com a resistência de alguns moradores da região, o lugar poderia estar mais presente no radar de outros shows.
O local também aparece como um fator importante para quem decide conhecer o evento. Leandro Marques, 25 anos, afirma que, além do line-up, o parque foi um dos motivos da escolha.
“Achei interessante por ser um espaço arborizado, nunca tinha ido antes. É bacana que seja um parque ecológico, com bastante sombra, árvores, e um clima mais fresco, que é justamente o que a gente procura em festivais, mas quase nunca encontra”, nos conta.
Junto com os novos ares, o Sensacional apostou também em edições mais psicodélicas e fantasiosas, reforçada pela parceria com a Festa da Luz, evento anual de arte e iluminação da capital mineira. Neste ano, a estética se consolidou como parte essencial da experiência, com obras já conhecidas e outras exclusivas que, à noite, ganhavam vida e envolviam o público em uma atmosfera quase devaneadora, fazendo de cada pessoa parte da obra. Entre elas, “Plantas Pulsam”, de Thiago Mazza, um enorme coração recoberto por folhas vermelhas; “Ventura”, de Amanda Lobos, uma criatura mítica de nove metros que carrega uma estrela do céu; além das já tradicionais frases em luzes neon, que convidam a contemplar com registros fotográficos.


A organização merece elogios, o espaço foi bem aproveitado para acomodar a estrutura do evento, com quatro palcos, atrações especiais, bares, espaço de alimentação e diversos banheiros (mesmo que ainda sejam químicos) com fácil acesso e sem filas. Em contrapartida, houve relatos de longas esperas em alguns dos food trucks, que contavam com preços bem altos, assim como o valor da água, o que poderia ser facilmente resolvido com mais postos de hidratação espalhados pelo parque, o que, hoje, é essencial e está presente em muitos festivais do mesmo nível.
Nesta edição, o Sensa! entregou o que talvez seja o seu line-up mais diverso, ponto principal para justificar o seu crescimento ao longo dos anos, reunindo nomes como Zeca Pagodinho (samba e pagode), Marina Sena e IZA (MPB atual e pop), L7NNON e Duquesa (rap e funk), Letrux (DJ set), BaianaSystem (samba-reggae) e vários outros, divididos entre os quatro palcos.
Era fácil notar a felicidade dos artistas ao se apresentarem pessoas diversas e abertas a todo tipo de música. Zeca Pagodinho e Evinha, veteranos, colocaram todo o gramado para cantar seus sucessos com grandes sorrisos estampados no rosto durante a tarde. Da mesma forma, de artistas pequenos que performaram em palcos menores e foram recebidos com um público grande e curioso para conhecê-los.


Com um dos shows mais esperados do dia, Marina Sena, apresentou um espetáculo à parte, com foco em seu novo disco, “Coisas Naturais”. Porém, ela não deixou de lado seus maiores hits, como “Por Supuesto” e “Tudo Para Amar Você”. Em sua terceira edição consecutiva, é difícil discordar que ela poderia estar facilmente em todas as próximas sem reclamação do público. Como ela mesma apresentou, sua sintonia em terras mineiras é ainda mais especial.
Thais, 23 anos, contou que começou a acompanhar Marina Sena no fim de 2024 e não pensou duas vezes quando a cantora foi confirmada pelo perfil oficial do Sensacional, garantiu sua entrada na mesma hora.
“Foi a primeira vez que fui a um show de um artista que eu realmente gostasse e acompanhasse, então foi mágico pra mim”, resume. O depoimento reforça o magnetismo de Marina, que, ao brincar no palco sobre já ser “residente” do Sensa!, continua atraindo novos rostos para o festival.
Da mesma forma, IZA, uma das vozes mais potentes do pop nacional, compartilhou energia e sorrisos abertos com um mar de pessoas ao pôr do sol. “O show da Iza me marcou muito. É uma artista que escuto e sou fã desde 2018 e nunca tive a oportunidade de vê-la ao vivo. Então ter essa experiência de cantar as músicas que gosto e sempre ouvi foi bem marcante.” Relata, Augusto Oliveira, 26 anos.
Por outro lado, alguns shows deixaram a desejar em termos de experiência para o público. Provavelmente, a produção do festival não antecipou o tamanho do grupo de fãs que a rapper Duquesa atrairia, a colocando no palco Cemig. Segundo relatos, a iluminação do espaço era insuficiente e, como os palcos menores não contavam com telões, quem estava mais atrás simplesmente não conseguia enxergar a apresentação. Juja Miranda, 26 anos, relatou não conseguir assistir ao show de Duquesa, nem de Melly, pelas mesmas razões. Nas redes sociais, o assunto também entrou em pauta:
Por isso, para o próximo ano, fica a expectativa de que os organizadores invistam em melhorias nas estruturas de visibilidade dos palcos menores.
Entre acertos e deslizes, é difícil negar que o festival continue apostando em sua diversidade. Seja pela pluralidade do público, que se expressa em diversos estilos, seja pela mistura de ritmos musicais, etnias e atrações, como o Comitê Indígena Mineiro, presente pela terceira vez como ato de abertura. O Sensacional ainda se consagra como um dos grandes nomes alternativos.
Pedro Henrique, 18 anos, que foi pela primeira vez ao evento, conta sua percepção: “Cuidado e a curadoria com a parte artística, com exposições de arte e um circuito cultural condizente com a estética e simbolismo do festival, apresenta essa vibe "alternativa" que é negligenciada por parte de alguns realizadores de festivais e casas de show”.
Trofeu social à risca?
Desde o fim da pandemia de Covid-19 e a consequente retração do mercado cultural, o anseio da população por eventos presenciais impulsionou um crescimento no setor de 400%, de 2021 para 2022, segundo dados da Associação Brasileira de Promotores de Eventos (Abrape), um impacto que ainda se reflete na área. Dessa forma, foram poucos os festivais e festas que conseguiram se manter e sustentar sua relevância na alta inflação do mercado.
Carolina Ramos, 21 anos, que atua com jornalismo cultural há dois anos, acredita que a capital mineira sentiu os efeitos desse acontecimento e admira a estabilidade do Sensa.
“Houve um boom muito grande de demanda quanto a acesso a festivais. Então, os que já existiam começaram a crescer muito, e o mercado deu uma inflacionada muito grande, o que não é à toa que fez com que outros festivais de Belo Horizonte acabassem ", nos conta.
Os outros festivais citados por Carolina fazem referência aos concorrentes diretos do Sensacional. O Planeta Brasil, que já foi o maior festival de BH, teve sua última edição em 2022, marcada por atrasos, cancelamentos, desorganização e conflitos com produtoras. Desde então, segue temporariamente suspenso.
Da mesma forma, o Breve Festival, evento de mesma natureza, que seguia ainda pequeno em comparação aos outros, teve a edição de 2022 cancelada dias antes de seu acontecimento devido à perda de patrocínio.
Atualmente, o principal concorrente do Sensa! é o Festival Sarará, que compartilha propostas semelhantes em termos de local e sonoridade, e ainda é querido por quem o acompanha. Em 2025, sua segunda edição no Parque das Mangabeiras teve pouca repercussão, mas apresentou nomes de peso como Liniker, BK’, Lamparina, entre outros. Os números de público, no entanto, não foram divulgados.
Caua Henrique, 22 anos, que compareceu nos dois concorrentes, nos relata: “São dois festivais incríveis. Ambos entregam atrações de peso e experiências legais, cada um tem sua identidade, mas os dois estão no mesmo nível de entrega e qualidade.”
Em contrapartida, Arthur Canedo, 27 anos, discorda: “Melhor que a esplanada do mineirão (antigo local do Sarará) que era absurdamente quente e hostil. Ainda assim, o sarará no mangabeiras não supera o sensacional. Se ao menos o festival fosse feito no parque de verdade, talvez a experiência seria diferente. Mas até hoje só fizeram no estacionamento que é super apertado”
Evidentemente, ainda que haja pontos a melhorar, o Festival Sensacional segue agradando seu público e, na maior parte, entrega o que promete. Se ainda não subiu ao pódio definitivo, está cada vez mais próximo dele. Com aprovação geral e curiosidade sobre os próximos passos, todos os entrevistados afirmaram que pretendem voltar na edição de 2026, marcada para os dias 7 e 8 de agosto.
Editoria e Revisão: Gabriel Barcelos