Reportagem de Maria Eduarda Collares
Às vésperas dos 97 anos da criação da UFMG, sua história e legado nos vem à mente, seja pelo seu significado social para Belo Horizonte ou pelo seu importante papel como disseminadora do conhecimento científico de qualidade. Por conta disso, muitas pessoas passaram pela universidade, cercadas por ideais, desejos e expectativas para com essa “incipit vita nova”, mas poucas são aquelas que acompanharam de perto o desenvolvimento da instituição ao longo dos seus anos de existência e que, a partir dessas vivências, viram na arte de ensinar uma maneira de auxiliar na trajetória de diversos alunos e da própria universidade, como o Professor Doutor Enio Roberto Pietra Pedroso, o docente mais antigo da UFMG.
Professor há 49 anos da Faculdade de Medicina da UFMG, o Dr. Enio Pedroso entrou na unidade em 1969 como aluno e, desde a sua graduação, em 1975, continuou seu percurso acadêmico e profissional nessa instituição, indo da especialização em Clínica Médica em 1974 até seu doutorado em Infectologia e Medicina Tropical em 1982. Além de professor e médico infectologista, ele compõe o corpo editorial da Revista Médica de Minas Gerais desde 1990, compartilhando um pouco do seu vasto conhecimento e bibliografia, essa que engloba dezenas de artigos publicados, projetos de pesquisa e livros de alto valor para o campo da medicina, assim como os títulos mais recentes “Doenças Infecciosas” (2015) e “Doenças do Sistema Digestório e da Nutrição” (2018), primeiros volumes da “Série Medicina Interna - SMI”.
O professor, que é belo-horizontino, compartilha um pouco do que o levou a carreira na medicina e a atuar como docente na UFMG, áreas essas que o consagraram como um servidor em destaque no país, a pensar logo na medalha de Ordem do Mérito Médico, classe de Comendador, concedida a ele em 2010 pelo ex-ministro da saúde, José Gomes Temporão, devido a sua notoriedade no cenário médico brasileiro, tanto no exercício da profissão quanto nas pesquisas e obras de grande valor para a área.
Primeiramente, o que te fez cursar medicina na UFMG? A gravidade da Paralisia Infantil (poliomielite), que acometia muitos de meus colegas na década de 1950, me atraiu para a Medicina como forma de lutar contra a doença grave infantil - assim achava naquela época que por chamar infantil só acometia as crianças.
Adentrando mais no ambiente acadêmico e docente, como foi sua transição do “ser aluno” para o “ser professor”? Nos últimos anos da graduação tive a oportunidade de conhecer um professor, dentre vários, entusiasta da educação, e educação médica em especial, que influenciou vários colegas, eu especialmente, e que nos deu a oportunidade muito jovem de iniciar a docência. Naquela época não havia a exigência de pós-graduação para o exercício da docência. Logo no primeiro ano de minha residência médica ele já me deu a oportunidade única de minha vida para o início da docência ao estimular minha presença com alunos do último ano da graduação. Assim começou.
Sobre o contexto sociopolítico no qual o senhor viveu durante todo o seu ensino superior, que foi o regime militar brasileiro (1964-1985), como era o “clima” e as vivências na Universidade, seja como aluno ou como professor pesquisador? Participei com vários colegas de todos os movimentos, muitos dolorosos e dramáticos, seja como membro do Diretório Acadêmico, da Associação dos Médicos Residentes ou como docente em Comissões de Avaliação de Desatinos da Ditadura.
Como homenageado e paraninfo de diversas turmas de medicina ao longo de sua carreira, momentos assim devem gerar grande satisfação e sensação de “dever cumprido” para com esses futuros colegas de profissão. O senhor poderia compartilhar algum momento marcante com alguma dessas turmas ou algum episódio significativo durante seus anos como professor? É de honra, mas de benevolência e benesse comigo. Não há um momento, mas todos de Turmas diversas que têm comigo desde então relacionamento estreito e de intenso sentimento de que a missão de educador é o desafio de maior importância para a formação de pessoas que têm como o substantivo de suas vidas acolher e cuidar de pessoas.
Em demais matérias, é notória a importância da universidade e do exercício da docência na jornada do doutor Enio Roberto P. Pedroso, tendo em vista esse laço tão duradouro que possui, em especial, com a Faculdade de Medicina, inclusive, a primeira Escola Médica criada no Brasil. No relato feito em 2023 para a comemoração dos 105 anos desta faculdade, o médico comenta não só seu histórico na instituição como também reflete sobre a função social daqueles que a representam:
“Eu, sendo aluno dessa Faculdade e, hoje, felizmente, o professor mais antigo da escola, tenho muito orgulho disso. Entender essa história cabe a nós todos. Ela é desafiadora e, ao mesmo tempo, ilumina o presente e o futuro. [...] A celebração deve ser sempre um marco de reflexão do nosso papel com relação a formar novos recursos humanos comprometidos com a sociedade brasileira, dignos e éticos. Sendo capazes, assim, de entender com humildade que seu papel social é reverter para o povo brasileiro aquilo que ele merece e precisa para ser feliz.”
Mais do que meros membros da universidade, trajetórias como a do professor Enio reforçam os ideais do papel da educação e, principalmente, do ensino superior para com a sociedade. Aqui, são formados os futuros profissionais e pesquisadores das mais diferentes áreas do saber, que devidamente aparelhados pela instituição e pelos seus colaboradores, podem perpetuar seu legado. Ou seja, esse status como uma das melhores universidades do país é essencialmente fruto dos esforços de diversos profissionais, estudantes e professores que, ao depositarem um pouco de si nas paredes dessa instituição, transformaram a UFMG no que conhecemos hoje: um espaço moldado pelas pessoas que ali estão
Trajetória belíssima!